O estudo revela redução das desigualdades entre mulheres e homens nos locais de trabalho. Foram analisadas 3.795 empresas, presentes em 27 países e representando cerca de 103 milhões de trabalhadores. O relatório analisa 21 indicadores de igualdade de gênero nas empresas, incluindo equilíbrio de gênero na força de trabalho, disparidades salariais entre homens e mulheres, licença parental remunerada, políticas contra o assédio sexual, racial e étnico, e apoio a funcionários, com diversidade de gênero, entre outros.
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Esse movimento pró-equidade segue se contrapondo ao predomínio de graves disparidades de gênero, indicando que há longa luta para superar essa iniquidade. Enquanto países como França, Espanha e Reino Unido avançam em políticas públicas, negociação coletiva e iniciativas empresariais que reduzem essas desigualdades ou as superam, há países que atuam de forma contrária. Movimentos conservadores bloqueiam essa mudança, como nos EUA, ou em empresas que diante de dificuldades econômicas diminuem a ênfase nesse tipo de política.
Os avanços legislativos são impulsionadores estratégicos de políticas de equidade de gênero nos locais de trabalho, assim como as negociações coletivas são instrumentos poderosos pelos quais sindicatos e empresas pactuam regras, medidas, programas, práticas, princípios para enfrentar e superar essas mazelas.
Das quase 3,8 mil empresas analisadas, apenas 41 dessas, pouco mais de 1%, conseguiram eliminar as disparidades salariais entre homens e mulheres em 2023. Mantido esse ritmo e velocidade para o universo pesquisado, seria necessário 1 século para acabar com essas desigualdades nesse universo de empresas. Observando esse grave problema no conjunto de empresas e de países, 1 século pode ser considerado tempo breve se não houver aceleradores da mudança.
Alcançaram o equilíbrio de gênero na composição da força de trabalho, nos cargos de gerência e na alta direção e conselho, 32 empresas. Observando essas dimensões para o conjunto de empresas analisadas, destaca-se que:
• 38% da força de trabalho são mulheres e 62% são homens;
• 27% dos cargos de gestão são ocupados por mulheres e 73% por homens;
• 22% dos executivos são mulheres e 78% são homens;
• 30% dos quadros de conselho e diretoria são mulheres e 70% homens;
• 7% dos CEO são mulheres e 93% são homens; e
• Apenas 32 empresas (0,8%) das 3,8 mil empresas alcançaram equilíbrio de gêneros em todos os quesitos acima.
O relatório apresenta a lista das 100 empresas com melhor desempenho. Transurban (Austrália) é a empresa com a melhor performance (80% de pontuação), melhor nota observada desde quando o relatório passou a ser publicado em 2017. Storebrand (Noruega), Diaegeo (Reino Unido), National Grid (Reino Unido) e GPT Group (Austrália) obtiveram 79% de pontuação. A pontuação média desse grupo de 100 melhores empresas evoluiu de 66% para 71% em 1 ano. Considerando-se o conjunto das empresas, a pontuação global também evoluiu nesse período de 37% para 44%.
As empresas da Austrália e do Reino Unido dominam o ranking das 100 mais, com 24 e 25 empresas, respectivamente, representadas, fruto do importante impacto da política pública de igualdade salarial. Os países que melhor pontuaram em termos de igualdade de gênero no mundo do trabalho são a França (57%), Espanha (56%), Reino Unido, Noruega e Países Baixos (54%), Itália (53%) e Austrália (52%). Esses países obtiveram esses resultados positivos porque possuem legislação que impulsiona forte transparência empresarial no quesito igualdade de gênero e fortalece a negociação coletiva.
• Na França, desde 2011, existem quotas obrigatórias de 40% para a representação de mulheres nos conselhos de administração; nas equipes executivas há metas a serem atingidas de 30% até 2027 e de 40% até 2030. Desde 2018 as empresas com mais de 50 funcionários devem comunicar ao governo seus resultados em termos de disparidade salarial, embora somente 42% fazem essa comunicação ao público, já que a lei não obriga essa prática.
• Na Espanha, a lei dispõe que as empresas devem comunicar as disparidades salariais entre homens e mulheres e ter planos para enfrentar o problema.
• No Reino Unido, a obrigação de comunicação de disparidades salariais está em vigor desde 2010 e foi regulamentada em 2017. Cerca de 86% das empresas fazem a comunicação de disparidade de gênero.
• Nos Países Baixos, foi aprovado em 2011, quota obrigatória para nomeação para conselhos de administração (1/3 de mulheres).
• A Noruega, há lei que define quota de 40% para mulheres em conselhos de administração desde 2003.
• Na Itália, houve aumento da quota obrigatória de mulheres nos conselhos de administração para 40% em 2020. Foi criado Certificado de Igualdade de Gênero, para registrar os avanços das empresas.
• Na Austrália, a Lei de Igualdade de Gênero no Local de Trabalho (2012) promove a transparência corporativa e, em 2023, foi aprovada regra que obriga as empresas com mais de 100 empregados a publicar relatórios de disparidade salarial.
• A Nova Zelândia tem legislação de Igualdade Salarial.
• O Japão tem legislação que obriga a comunicação de disparidades salarial em empresas com 301 ou mais funcionários (2023), com 58% das empresas fazendo a divulgação.
Embora os dados indiquem evolução positiva, é lamentável observar que, nesse universo de empresas, 67% permanecem sem divulgar as informações sobre disparidades salarias desagregadas por gênero. Apenas 17% das empresas em mercados desenvolvidos publicaram estratégias para eliminar disparidades salariais entre mulheres e homens3.
O Brasil passa a integrar a lista de países de promovem legislação pró-igualdade. Em julho de 2023, o presidente Lula sancionou o PL (Projeto de Lei) 111/23, aprovado pelo Congresso Nacional, transformando-o na Lei 14.611/23. Essa nova lei dispõe sobre a igualdade salarial e critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho igual ou no exercício da mesma função.
A lei aponta medidas para a promoção da transparência salarial, incremento da fiscalização, disponibilização de canais para denúncia, promoção de programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho, e o fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, permanência e ascensão no mercado de trabalho.
O Decreto 11.795/23, que regulamenta essa lei, detalhando a forma e o conteúdo do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, obrigação semestral de todas as organizações contratantes com 100 ou mais empregados.
Esse Relatório, seguindo a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), será elaborado com as atuais informações que as empresas já fornecem no eSocial, plataforma no qual declaram as informações trabalhistas dos seus empregados, com algumas complementações. A partir desses dados, cada empresa deverá divulgar relatório que tratará dos cargos ou ocupação, dos valores das remunerações e salário contratual; 13° salário; gratificações; comissões; horas extras; adicional noturno, insalubridade, penosidade, periculosidade, entre outros; férias; aviso prévio trabalhado; descanso semanal remunerado; gorjetas; e outras remunerações previstas em norma coletiva de trabalho.
O desafio está posto para sindicatos e empresas no Brasil: promover, por meio da negociação coletiva, o enfretamento dessa grave desigualdade. Aqueles que não tem medo da negociação coletiva, não recorrem à Justiça com subterfúgios para manter essa iniquidade! Devemos negociar a melhor política pró-igualdade para cada realidade e contexto.
Essas medidas representam passos importantes na busca por uma sociedade mais igualitária e justa, na qual homens e mulheres tenham oportunidades iguais no ambiente de trabalho. A continuidade e a ampliação desses esforços são essenciais para alcançar uma verdadeira igualdade de gênero nas empresas e na sociedade como um todo.
(*) Sociólogo, coordenador do Fórum das Centrais Sindicais, membro do Cdess (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável) da Presidência da República, membro do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, consultor e ex-diretor técnico do Dieese (2004-2020).